Luís Eduardo Gomes
O futuro da agricultura não deve ser o foco no aumento da
produtividade e a especialização em uma única cultura, como vem
ocorrendo com a soja, mas sim a busca pela diversidade de culturas e de
uma produção rural de valor agregado, essa foi a mensagem passada pelo
professor Sérgio Schneider, do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Rural da UFRGS, na Palestra Magna que abriu os debates
do seminário Agricultura e Desenvolvimento – Segurança Alimentar,
realizado na manhã desta quinta-feira (7) na PUCRS.
Na palestra, intitulada “Perspectivas da Agricultura e Segurança
Alimentar do RS: Desafios frente aos cenários nacional e global”, ele
destacou que há um novo cenário internacional na produção de alimentos
que modifica a relação da agricultura com outros setores. Segundo ele, a
agricultura do século 21 não poderá mais seguir as mesmas bases da
chamada “revolução verde”, que buscava um aumento da produção para
atender a demanda alimentar – objetivo que já teria sido cumprido -, mas
deve focar em produzir boa alimentação, se relacionando de forma
sustentável com questões como as mudanças climáticas, saúde e nutrição e
a maior urbanização das cidades, especialmente em países ainda em
desenvolvimento. “Nós não necessariamente precisamos produzir mais,
precisamos produzir melhor”, afirmou.
Na opinião do professor, a humanidade vive atualmente um momento de
transição nutricional em que o grande problema do mundo não é mais a
fome, mas sim o fato de que as pessoas estão consumindo alimentos de
baixa qualidade, o que levaria, por exemplo, ao sobrepeso. No Brasil, em
2010, 57% dos adultos estavam em condições de sobrepeso ou obesidade, o
que gerava um gasto público em saúde estimado entre R$ 2 bilhões e R$ 5
bilhões, segundo Schneider. “O mundo vive hoje uma situação paradoxal:
por um lado, tem 800 milhões de pessoas em condições famélicas e, por
outro, 2 bilhões com deficiência de nutrientes”, disse.
Em uma palestra voltada para engenheiros agrônomos e pessoas que
trabalham na área, que abriu o evento promovido pelo Sindicato dos
Engenheiros do RS (Senge-RS), Schneider destacou que, dentro desse
contexto, organismos internacionais, como a FAO Organização das Nações
Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), já relacionam a agricultura
com o desenvolvimento sustentável, inserindo entre as metas para que
isso seja alcançado questões como a necessidade de mudança da base
energética para a produção — substituindo energias fósseis por
renováveis — e da utilização da terra sem destruir a biodiversidade.
Atualmente, o principal indicador que mede o sucesso de uma lavoura é
a produtividade por hectare, mas isso estaria prestes a mudar. Segundo
Schneider, em duas ou três décadas, os principais indicadores da
agricultura serão aqueles que avaliam a saúde alimentar da população.
Para isso, ele defende que será necessário ocorrer um reposicionamento
da matriz agrícola — no caso do Brasil, voltada atualmente para
especialização na produção de grãos, notadamente da soja, e de carnes –,
em que será necessário buscar um enfoque agroalimentar, que busca o
estabelecimento de sistemas e redes que desenvolvam estratégias e metas
para incrementar os indicadores de segurança alimentar, saúde e
nutrição. Segundo ele, isto pode ser alcançado justamente com a
diversificação das culturas.
Dependência da China
O professor destacou que o Rio Grande do Sul vem passando por uma
mudança demográfica que trouxe, está trazendo e continuará a trazer
grandes alterações para o setor agrícola, notadamente o fato de as taxas
de ocupação na agricultura estarem em constante queda, enquanto a
população está envelhecendo rapidamente — em 2040, estima-se que 25% da
população terá 60 anos ou mais.
Por outro lado, segundo ele, o Estado está trilhando um “caminho
suicida” de “sojicização” da agricultura. Schneider destacou que alertar
para isso não se trata de demonizar a soja, mas sim de apontar que o RS
está perdendo em competitividade ao se especializar para exportar para o
mercado chinês, enquanto perde oportunidade de acessar outros mercados
mais interessados na diversificação, o que acaba criando uma relação de
dependência que poderá ser muito prejudicial aos produtores gaúchos
quando ocorrer uma queda no consumo chinês ou a desvalorização nos
preços internacionais.
“Eu não acredito no conto do vigário de que o Brasil terá um caminho
de aumentar a oferta de alimento no futuro”, disse, salientando que a
demanda chinesa deve crescer sim nos próximos 10 anos, para depois
desacelerar. “Esse caminho como organização do nosso sistema
agroalimentar é perigoso”.
Além da palestra de Schneider, o 18º seminário do Senge contou com
painéis sobre os desafios tecnológicos da produção, políticas públicas
para a agroindústria familiar e mercados para os produtos da agricultura
familiar.