terça-feira, 6 de março de 2018

Integrantes do Consea apontam desafios a serem debatidos na 5ª+2

Imagem: Ascom/Consea
Imagem: Ascom/Consea
De 6 a 8 de março, será realizado em Brasília o Encontro Nacional 5ª+2. O encontro irá analisar a conjuntura e monitorar o 2º Plano Nacional de SAN, à luz das proposições da 5ª Conferência Nacional Segurança Alimentar e Nutricional, realizada na capital federal em novembro de 2015.
Além da análise da conjuntura, a 5a+2 iniciará o delineamento das prioridades para a 6a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.
O Consea ouviu militantes que participam ou já participaram direta ou indiretamente das conferências. Confira abaixo os desafios apontados.
Gleyse Peiter
Secretária-executiva da Rede Nacional de Mobilização Social (Coep) e ex-conselheira do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)
O tema soberania e segurança alimentar e nutricional ainda não está na pauta dos jovens. A execução das políticas públicas nas comunidades precisa desses jovens engajados para fazer o seu controle social e, o mais importante, eles querem fazer isso. É preciso fazer campanhas de mobilização por meio das redes sociais e sites, não só do Consea, mas das organizações que participam do conselho, tentando fazer uma "escuta "sobre a situação real de cada local, mobilizar também fortalecer a participação social, capacitar as pessoas, com foco no controle social das políticas, e fortalecer o conceito de "comida de verdade".
Ana Lúcia Pereira
Integrante dos Agentes de Pastoral Negros do Brasil (APNs) e conselheira do Consea
Para que a agenda tenha pontos e estratégias comuns é preciso que se parta do princípio de que a soberania e segurança alimentar e nutricional pressupõe a democracia e o desenvolvimento integral do indivíduo e do grupo ao qual está inserido. O autoritarismo e a ausência do Estado no campo da saúde, da educação, da segurança pública, impede que as famílias oriundas dos grupos sociais mais vulneráveis possam produzir o seu alimento ou ter acesso ao mesmo de forma digna e soberana. Nesse sentido, nos próximos dois anos temos que pautar a luta pela terra, o combate ao racismo institucional e ressaltar a importância da soberania e segurança alimentar e nutricional em todas as nossas ações. Entre as principais lacunas do 2º Plansan, destaco a ausência do combate ao racismo institucional.
Sônia Lucena
Professora aposentada da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e ex-conselheira do Consea
Uma profunda revisão deve ser feita na tentativa de mobilizar os atores sociais para recuperar suas energias e reiniciar a luta pela soberania e segurança alimentar e nutricional. Cada dia sinto um distanciamento desse tema nas pautas de prioridades locais ou de apoio aos que ainda resistem. Os órgãos ligados à nutrição poderiam mobilizar os profissionais para assumirem esse tema como prioritário. As tentativas feitas até agora apresentam resultados bastante frágeis. Temos que entender que parte da população tem acesso a esses profissionais e a formação deles é bastante insuficiente para trabalhar o tema de segurança alimentar e nutricional e terem argumentos para defenderem a “comida de verdade”.
Renato S. Maluf
Professor do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e ex-presidente do Consea
O maior desafio da 5ª+2 é oferecer para a sociedade um retrato do que se passa na área da soberania e segurança alimentar e nutricional no Brasil. O Consea está sob o desafio de construir uma agenda que, diferentemente do passado recente, está mais distanciada da agenda governamental. Uma boa questão para reflexão nesse momento é se e com que sentido podemos continuar nos dedicando a construir uma agenda propositiva.
Valéria Burity
Secretária-geral da Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar (Fian Brasil) e ex-secretária executiva do Consea
Uma pauta prioritária são as revogações de medidas que impactam sobremaneira direitos humanos e o direito à alimentação. A austeridade tem público certo, afeta principalmente pessoas empobrecidas. Em relação ao governo, o Plansan ainda é pouco usado como instrumento efetivo para articulação e integração de ações. Quanto à sociedade civil, falta se apoderar e exigir mais as metas que estão neste instrumento.
Vanessa Schottz
Integrante do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) e do Consea
Fomos muito felizes em propor o lema “Comida de Verdade” para a 5ª Conferência, pois é um lema de fácil compreensão e que tem potencial para dialogar com os diversos campos da sociedade brasileira. Todavia, o cenário da última conferência para cá mudou sensivelmente. A pergunta é: comida de verdade para quem? Como assegurar comida de verdade em contextos marcados pela violência, pelo desemprego, por desertos alimentares, pela exploração do trabalho, falta de saneamento básico? O corte orçamentário inviabiliza a execução do Plansan em sua plenitude.
Maria Emília Pacheco
Integrante da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) e do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN). Ex-presidenta do Consea
Os retrocessos e violações de direitos ocorreram e continuam ocorrendo. Precisamos enfatizar o chamamento que deve ter cada vez mais o sentido de “restaurar o Estado”, que está capturado pelos processos de financeirização e privatização da terra, água, bens da natureza. É preciso sensibilizar os prefeitos e governadores para o compromisso de ações públicas para a garantia da dignidade humana com a “comida de verdade” e não com a “ração humana”. É preciso denunciar os rumos da austeridade econômica, que atinge os pobres e não os ricos. A análise sobre o orçamento é vital para a execução do Plansan.
Nathalie Beghin
Pesquisadora do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e ex-conselheira do Consea
É preciso dialogar com os diversos segmentos. Sinto falta da dimensão de gênero: ainda é muito ausente. Contudo, como prioridade para os próximos dois anos, sugiro privilegiar a juventude – organizar a comunicação prioritariamente em torno desse grupo populacional, de modo a transformá-lo em “porta vozes” da “comida de verdade”. Valeria a pena pensar numa agenda positiva e aglutinadora para 2018 e 2019, aumentar a consciência em torno da necessidade de combater obesidade. A organização de alguns grupos focais poderia ajudar a montar uma campanha. A linguagem e o desenho devem estar orientados para a juventude. Tem que ser uma campanha que mobilize todos os setores.
Írio Conti
Pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Segurança Alimentar e Nutricional da UFRGS e conselheiro do Consea
O desmonte das políticas públicas está atingindo fortemente as populações pobres. Os mais afetados acabam sendo as populações negras, indígenas e povos e comunidades tradicionais. Os documentos do Consea devem frisar esses segmentos que são os mais diretamente atingidos pela fragilização ou ausência de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. É preciso lutar para a manutenção dos programas sociais e sua ampliação, das políticas e programas de estímulo à geração de emprego e renda e da recomposição orçamentária para os programas sociais. Temos que arrancar compromissos do governo com a implementação do Plansan e com a manutenção das políticas públicas de promoção dos direitos sociais.
Élido Bonomo
Professor na Universidade Federal de Ouro Preto. Atua nas áreas de segurança alimentar e nutricional, agricultura familiar e políticas públicas. Presidente do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN)
É necessário afirmar o desenvolvimento rural sustentável, os sistemas alimentares saudáveis, portanto a necessidade da transição do sistema de produção de alimentos convencionais para a agroecologia. Devemos fortalecer todas as ações possíveis com vista a serem incorporadas nos planos de segurança alimentar e nutricional e no Planapo [Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica] as principais deliberações da conferência como incidência sobre os orçamentos ministeriais, por meio da Caisan [Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional]. Além disso, é preciso denunciar toda forma de redução ou rebaixamento dos orçamentos públicos que afetarão os direitos sociais conquistados.
Edição: Francicarlos Diniz, com Nathan Victor (estagiário)